Telepatia: sugestões para a pesquisa (*)

A Parapsicologia, a cada ano que passa, comprova, sem sombra de dúvida, que não é mais uma tentativa à semelhança do Espiritismo e da Metapsíquica, de abordagem científica dos complexos fenômenos da paranormalidade.

 

O seu campo de pesquisas ultrapassa os limites do convencionalismo acadêmico – as fronteiras consagradas do conhecimento humano -, estudando o homem numa dimensão unitária mais ampla, não só no âmbito de suas capacidades comprovadas, mas, principalmente, no que diz respeito à suas potencialidades, vez por outra vislumbradas, em manifestações esporádicas, naqueles eventos insólitos denominados de paranormais.

 

Tinha razão J.B. Rhine (1) quando afirmou:

 

“É chocante, mas verdadeiro que conhecemos hoje o átomo melhor do que o espírito que o conhece”.

 

Estamos, assim, reunidos neste Congresso, não apenas para somar o que sabemos, mas, fundamentalmente, para ampliar o território do que desconhecemos, com consciência cada vez mais lúcida da nossa ignorância, que nos permite conjecturar, com certeza sempre maior, a respeito da talvez ilimitada capacidade da mente humana.

 

Definitivamente comprovado está, pela pesquisa parapsicológica, que o homem, em certas circunstâncias pode saber ou perceber, por meios ignorados e processos não convencionais, o que aconteceu, está acontecendo, ou acontecera, quer se trate de um evento físico ou psíquico E mais: certas pessoas parecem influir mentalmente sobre o mundo exterior, afetando os seres vivos e as coisas materiais.

 

Na verdade, o arsenal científico de que dispo­mos, de duvidoso valor epistemológico, é operacionalmente insuficiente para situar, adequadamente, o fenômeno paranormal em qualquer de seus modelos consagrados. Por isso a Psi é o patinho feio do grêmio científico.

 

Inadvertidamente, muitos parapsicólogos lançaram mão de sedutoras hipóteses de outras áreas acadêmicas como estratégia de explicação genérica para a fenomenologia paranormal. Tal procedimento, em si, não é equívoco, desde que essas hipóteses sejam admitidas como contribuições parciais ou cometimento analógico, visando facilitar a compreensão de cada fenômeno estudado. O perigo, porém, re­side na tendência ao reducionismo que leva, mesmo invo­luntariamente, o pesquisador a explicar o fenômeno paranormal, de modo abrangente, à luz dos conhecimentos de sua especialidade.

 

Outro inconveniente manifesto consiste na preo­cupação exagerada pelas explicações causais, dado os seus comprometimentos emocionais com concepções religiosas ou preferências filosóficas. Desde que ainda não sabemos siquer as condições que determinam a manifestação do fenôme­no paranormal, seria de todo recomendável que se desse prioridade a experimentos controlados e de extrema versa­tilidade as variações possíveis de determinada pesquisa, com o proposito de observar, em perspectivas cada vez mais amplas, as circunstâncias em que determinado fenômeno paranormal ocorre.

 

Já está na hora de a Parapsicologia estabelecer seus postulados básicos e elaborar mais versáteis modelos de pesquisa, visando a formulação de uma hipótese abrangente de toda a fenomenologia paranormal. Se é limitante a explicação do desconhecido pelo conhecido, por outro lado torna-se tautológica a explicação do desconhecido pelo desconhecido. É preferível, assim, estabelecer, como hipótese basilar de trabalho que, em princípio, deve atribuir-se à mente de uma pessoa viva a causa dos fenôme­nos paranormais, cabendo ao parapsicólogo estudar e pes­quisar essa modalidade de atividade psíquica em todas as suas manifestações.

 

Inicialmente, seria recomendável por em execução o ponto de vista de Rhine (2) sugerindo a unificação da telepatia e da clarividência sob a denominação de ESP ou PES. Na verdade, a divisão do fenômeno de psi-gama em três modalidades é artificial e sem nenhum sentido práti­co. Já se discutiu, sem qualquer solução, a prevalência da telepatia sobre a clarividência e vice-versa. Imaginaram-se procedimentos – todos discutíveis – para se isolar não apenas conceitualmente, mas experimentalmente, os dois fenômenos, a fim de se obter a telepatia pura e a clarividência pura. Já é tempo, porém, de se parar com esse artificialismo que nada de concreto resultou para a inteligibilidade daqueles fatos. Porque, se quisermos lançar mais gravetos à fogueira, poderemos argumentar que a clarividência e a telepatia são redutíveis à precognição. A Psi independe do contexto tempoespacial, torna-se evidente que o médium é suscetível de conhecer, antecipadamente, tudo o que existe em qualquer parte do espaço e em qualquer seção do tempo. Não existe, pois, nada capaz de impedir que o médium conheça, previamente, a experiência a que vai ser submetido, mesmo que tais experimentos se realizem pelos mais complicados mecanismos eletrônicos. Parece que o acaso não existe para a faculdade psi. Sob esse enfoque, logo se deduz que a telepatia e a clarividência não são fenômenos autônomos, mas tão somente modos distintos da manifestação precognitiva. Assim, em certas circunstâncias, o homem pode conhecer o futuro e, algumas vezes, inconscientemente, “forçar” o acontecimento “previsto”.

 

De todos os fenômenos de psi-gama, a telepatia aquele que melhor se apresta a uma abordagem experimental. Ele parece comum a todas as pessoas, pois, dificilmente se encontrará alguém que, ao menos uma vez na vida, não tenha passado por uma experiência aparentemente telepática. As pesquisas, sob forma de inquérito, realizadas pelo Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas I.P.P.P. – no meio universitário – Universidade Federal de Pernambuco e Universidade Católica de Pernambuco – demonstraram a altíssima incidência da telepatia numa faixa etária situada entre os 18 a 30 anos de idade. Os demais fenômenos de psi-gama – clarividência e precognição – não alcançaram índices tão significativos.

 

A telepatia é, faticamente, coincidência psíquica: duas ou mais pessoas participam, simultaneamente, de um acontecimento mental. É evidente que essa experiência psíquica recíproca não é necessariamente sincrônica. Há muitos casos em que o estado psicossomático de alguém é partilhado por outrem, porém não concomitantemente. É o que Frederich Myers denominou de latência telepática. Não se deve, no entanto, confundir essa forma de telepatia de efeito retardado com a adivinhação do passado ou retrocognição. Conceitualmente, a retrocognição não é telepatia, pois os fatos adivinhados podem ter ocorrido num lapso de tempo muito distante. Mesmo assim, procura-se explicar a retrocognição pela telepatia, admitindo-se que, se uma pessoa adivinha o passado de outra, é porque recolheu do inconsciente desta as informações ali existentes.

 

Também se utiliza a telepatia como explicação para a precognição, sob fundamento de outra hipótese: a de que o futuro de cada pessoa está previamente progra­mado em seu inconsciente. Assim, um médium, por um mis­terioso processo de prospecção psíquica, seria capaz de ter acesso ao programa existencial de outrem e, desse mo­do, tomar conhecimento de alguns lances do seu futuro.

 

A telepatia, portanto, em sua exata conceituação, é comunhão psíquica entre duas ou mais pessoas, con­quanto tal experiência possa ressentir-se de uma pequena incoincidência temporal.

 

Mas, na verdade, o que é a telepatia?

 

Sob o ponto de vista estritamente fático, ela é, como já vimos, um fenômeno de coincidência psíquica entre duas ou mais pessoas.

 

Wately Carrington (3), aprofundando mais o proble­ma, suscitou a hipótese da telepatia como um processo es­pecial de associação de ideias. Para ele, o espírito é um sistema de psicones, como o corpo é um sistema de células e órgãos. O fenômeno telepático, conforme Carrington, é pertinente ao universo psíquico, transcorre no espaço psíquico e, por conseguinte, não pode ser explicado por relações meramente físicas. Pois bem, em certas circuns­tâncias, dois sistemas de psicones poderão apresentar a mesma configuração, estabelecendo entre eles, por associa­ção, um transitório condomínio psíquico.

 

A hipótese de Carrington, embora bastante sedutora, não oferece qualquer condição para sua verificabilidade, valendo, sob esse aspecto, tanto quanto as demais ex­plicações para o referido fenômeno.

 

Se a telepatia, como um todo, apresenta alto índice de incidência, o mesmo não ocorre quanto ao seu grau de fidedignidade, se considerada em cada caso individual.

 

Os parapsicólogos tchecos são de opinião que a telepatia é um canal com tão alto nível de ruído que, praticamente, quase toda mensagem se perde. E, para evitar esse inconveniente, propõem experiências com mensagens co­dificadas num sistema binário.

 

Já os seus colegas soviéticos acreditam que o rapport corporal entre as pessoas envolvidas numa experi­ência telepática é capaz de favorecer a manifestação desse fenômeno.

 

No entanto, há médiuns, como Francisco Cândido Xavier, que podem estabelecer uma quase perfeita, ou mesmo perfeita, comunhão psíquica com as mais diversas pessoas, onde o “ruído” no canal de comunicação parece quase ine­xistente. Como é que um médium desse porte consegue tão elevado grau de fidedignidade telepática, a bem da verda­de não o sabemos e cremos que também ele próprio não o saiba. A telepatia é uma linguagem singular, cuja gramá­tica desconhecemos. O médium, intuitivamente, sabe ler essa linguagem oculta, mas não sabe, precisamente, como faz a sua “leitura”.

 

Schrenck Notzing (4) compara o médium a um artis­ta que necessita de um clima psicológico propício à mani­festação de suas energias criadoras. Tem razão o famoso pesquisador germânico, pois, verdadeiramente, o artista não aprende sua arte: nasce com ela. O que ele pode é tão somente aprimorá-la. A inspiração acontece, embora o ar­tista experimentado saiba os meios de facilitar o seu “acontecimento”. Nisso reside a excelência do seu arte­sanato.

 

Assim, também, o médium não aprende sua paranormalidade: nasce com ela. Por isso, constitui uma inequí­voca prova de ignorância exigir-se de um médium a produção de um determinado fenômeno, em qualquer circunstância, pois, à semelhança do artista, ele não determina, a seu bel prazer, a manifestação de sua faculdade. Qualquer ti­po de coação, por mais sutil ou velada que seja, é susce­tível de bloquear a inspiração do artista e a manifestação paranormal do médium.

 

O que devemos observar, outrossim, na pesquisa, e o problema das diferenças individuais. Aqui não nos re­ferimos a questão da personalidade sob o ponto de vista psicológico, mas, sim, da individualidade paranormal de cada médium. Denominamos de individualidade paranormal o estilo pessoal de determinado médium exercer a sua facul­dade. Isso quer dizer que o pesquisador deve esforçar-se para descobrir como obter o melhor desempenho possível de um médium, adaptando as condições da pesquisa às carac­terísticas específicas da sua paranormalidade. É preciso saber fazer o médium funcionar, pois, não raro, são os próprios pesquisadores que, por sua própria inabilidade, não sabem como extrair o melhor rendimento possível das fa­culdades paranormais até mesmo dos mais extraordinários médiuns. Ao contrário, um pesquisador experimentado e ha­bilidoso pode conseguir o máximo desempenho de pessoas do­tadas de uma incipiente paranormalidade. Talvez, o pro­blema da pesquisa não se resuma apenas na carência de grandes médiuns, mas, sim, no despreparo ou no preconceito dos próprios pesquisadores. Ora, inibir um médium é, re­almente, muito fácil: qualquer pessoa pode fazê-lo. Di­fícil mesmo é botar um médium para funcionar na plenitude de sua capacidade, evitando, ao máximo, o declínio do seu desempenho, apesar da repetição prolongada das experiên­cias. Manter o nível ótimo de motivação para sustentar o índice de acertos que, geralmente, tende a cair – efeito de declínio – pela monotonia e saturação do método quanti­tativo, é, na verdade, uma façanha que só pode ser reali­zada por um pesquisador altamente qualificado.

 

O importante, pois, não é apenas procurar mé­diuns, mas, principalmente, treinar pesquisadores. E o bom pesquisador é aquele que sabe quando deve começar ou sus­pender uma experiência na hora certa. A experimentação nunca deve ser encarada como uma maratona ou singular olimpíada, onde se exija que os médiuns estejam procurando superar as suas marcas anteriores. Podemos, no entanto, em certas circunstâncias especiais, estimula-los nessa tentativa, desde que observadas as cautelas necessárias.

 

Por outro lado, é de fundamental importância que o médium se engaje na pesquisa de sua faculdade. Ele não deve ficar passivo e nem se sentir como uma cobaia durante o experimento. Pelo contrário, a sua atitude deve ser de ampla colaboração ativa, anotando as suas reações por ocasião dos fenômenos e agindo também como pesquisador.

 

Muitos parapsicólogos andam ansiosos em trabalhar com grandes médiuns – o que, na verdade, não é fácil. Deveriam, no entanto, aprender a lidar com médiuns modestos – o que não é difícil – e deles obter, habilmente, resultados significativos. Assim, será possível realizar um trabalho altamente gratificante com os que denominamos fronteiriços paranormais, isto é, aqueles indivíduos que embora não sejam médiuns na acepção do termo, transitam frequentemente, em níveis de acertos experimentais nos limites extremos da casualidade e, consequentemente, nos estágios mais modestos de uma incipiente atividade paranormal. Entretanto, esporadicamente, eles conseguem obter marcações expressivas na experimentação com o baralho Zener. O que não sabemos, ainda, é se a faculdade paranormal pode ser melhorada pelo seu exercício. Se isso for viável, o trabalho realizado com os fronteiriços paranormais passará a ser altamente promissor.

 

O que queremos dizer com tudo isso é que devemos abandonar, em princípio, a preocupação de trabalhar com grandes médiuns. Porque, afinal, os grandes médiuns exigem um tratamento especial: eles devem ser experimentados também por grandes pesquisadores. Em caso contrário, esses médiuns serão prejudicados pela incompetência de improvisados parapsicólogos, os quais nada têm a perder com a sua imperícia e até mesmo dela se valem para justificar seus fracassos, proclamando que não descobriram qualquer fenômeno paranormal, porque tudo não passava de fraude. Os grandes médiuns são raríssimos e poucos são os pesquisadores que sabem trabalhar com eles. Por isso, é importante que nos conformemos em lidar com os médiuns mais modestos até com os fronteiriços paranormais.

 

Tarefa sobremaneira difícil para o parapsicólogo é a de conseguir a colaboração de médium espirita na investigação dos fenômenos que diz produzir. Por sua própria formação religiosa, ele está condicionado a atribui aos espíritos a autoria de qualquer fenômeno aparentemente insólito. Ele não quer ser rotulado de “médium anímico”, pois, para a maioria dos espíritas, o animismo se confunde com mistificação, é sintoma de declínio mediúnico ou, ain­da, falta de assistência espiritual. Aprendeu que a mediunidade é uma provação ou uma missão e, portanto, sua obrigação é servir de instrumento às manifestações dos espíri­tos. Por isso, não admite que os fenômenos que produz se originem de sua própria mente, preferindo viver na ilu­são de que é objeto da preocupação dos seres superiores e, também, de sua proteção. É compreensível, portanto, a sua relutância em participar de experiências parapsicológicas, porque, no íntimo, está temeroso de que elas reve­lem o seu animismo, comprometendo-lhe o prestígio de mé­dium e ferindo, fundamente, a sua crença e o seu narcisismo transcendental. E, sob os mais variados pretextos e as mais tolas evasivas, o médium espírita se furta a qualquer investigação científica sobre a sua mediunidade. Ele, verdadeiramente, está interessado nas suas pretensas relações com o mundo espiritual e, não, em conhecer a real natureza de suas faculdades.

 

O que fazer, então, face a essa deliberada intransigência?

 

Entendemos que a melhor solução é o parapsicólogo abandonar, em princípio, a preocupação de fazer experi­ências com médiuns espiritas, por mais famosos que eles sejam. Os propósitos dos parapsicólogos e dos médiuns espíritas são claramente conflitantes. Estes querem pro­var, a todo custo, que os seus fenômenos são produzidos pelos espíritos. E aqueles estão interessados em conhecer a natureza da faculdade paranormal, como funciona e o modo de sua possível manipulação voluntária, pois acreditam, até prova em contrário, que tais fenômenos são produzidos pela mente humana. Sem qualquer interferência consciente e voluntária do homem, realizam-se, no seu organismo, as mais complexas e misteriosas atividades fisiológicas e psíquicas, sem que elas sejam atribuídas à interferência de alguma inteligência exterior.

 

Essas considerações não importam na negação da existência do agente teta, nem de sua possível influência sobre o mundo físico, pois, cientificamente, o espírito é ainda uma hipótese, conquanto bastante respeitável. Por sua vez, a mente humana é um fato concreto e o parapsicólogo está interessado em saber cada vez mais sobre ela e até que ponto é responsável pelos fenômenos paranormais.

 

Face a esse estado de coisas, o parapsicólogo só tem um caminho a escolher: realizar experiências com maior número possível de pessoas, selecionando aquelas que aparentemente, evidenciem faculdades paranormais e iniciar o seu treinamento dentro de um modelo científico de pesquisa. Com essa atitude, o parapsicólogo não está proibindo os médiuns de suas experiências com o agente teta, mas orientando-os numa experimentação onde inexista o interesse de provar o intercâmbio mediúnico entre vivos e mortos. Essa prudência metodológica não impede, todavia que, de tais experimentos, resultem subsídios para fortalecer a hipótese da sobrevivência pessoal.

 

A pesquisa parapsicológica não está interessada nos poderes do agente teta, mas, sim, nos poderes paranormais do homem vivo. Aliás, esse era o entendimento de um notável pesquisador espírita, Ernesto Bozzano (5), quando asseverou que “para resolver o grande problema da sobrevivência do espírito humano desencarnado, o melhor método é o de estudar os poderes do espírito humano encarnado”.

 

Nada obsta que, pessoalmente, o parapsicólogo possa interessar-se pela intervenção dos espíritos desencarnados na vida material. Porém, lhe é vedado misturar suas crenças particulares com os objetivos da Parapsicologia, utilizando-se dessa ciência para fazer proselitismo religioso ou filosófico. A finalidade da Parapsicologia não é a de provar ou a de negar a hipótese da sobrevivência, conquanto possa, indiretamente, contribuir para a sua discussão. O próprio J.B. Rhine (6) chegou a admitir que “a pesquisa da ESP faz diretamente surgir a questão do lugar da personalidade no sistema espaço-tempo, oferecem positiva indicação a favor da sobrevivência”. E, em outra obra (7), assevera que “correto é dizer que a investigação da hipótese da sobrevivência e da comunicação dos espíritos seria investigação parapsíquica”.

 

Infelizmente, muitos parapsicólogos vivem mais preocupados em provar ou defender hipóteses do que em melhorar os padrões de pesquisa. Há uma lamentável carência de criatividade no que diz respeito a novas técnicas experimentais, que visem facilitar a observação e controle dos fenômenos e até mesmo a sua produção.

 

É importante, a essa altura, indagar, em maior pro­fundidade, sobre o possível mecanismo do fenômeno telepá­tico.

 

Pensa René Sudre (8) que, na telepatia, há predo­minância dos estados afetivos sobre os intelectuais. Em consonância com esse entendimento, o médium Harold Schermann (9) confessa que nunca pôde obter resultado sempre elevado nas provas de cartas ESP, porque a estas falta o fator emocional.

 

Por sua vez, Robert Thouless (10) destaca a in­fluência da personalidade do pesquisador nos resultados de uma experiência parapsicológica.

 

Milan Rizl (11) afirma:

 

“A forma última da ex­periência de PES, por conseguinte, depende do estado de preparação e do tipo psíquico da pessoa percipiente: se a pessoa é do tipo visual, provavelmente terá visões, do ti­po auditivo ouvirá vozes e do tipo motor provavelmente se­rá estimulada a ter uma reação motora”.

 

O médium Wolf Messing declarava que o pensamento das pessoas lhe chegava em imagens. A decodificação da mensagem tele­pática, na modalidade alucinatória, pode confundir-se, assim, com um fenômeno de clarividência.

 

Schrenck Notzing, Rhine e Sudre admitem a influ­ência do fator sexual nos comunicados telepáticos, que se tornam mais frequentes entre pessoas do sexo oposto. É possível, portanto, que uma paixão, muito intensa estabele­ça, entre os amantes, uma comunhão psíquica mais profun­da do que eles imaginam.

 

Por outro lado, experimentos psicológicos, ob­jetivando uma melhor compreensão do fenômeno PES, conquan­to não conclusivos, forneceram, no entanto, indicações su­gestivas para a pesquisa parapsicológica. Assim, as apli­cações do TMD (Teste do Mecanismo de Defesa) revelaram que pessoas com alta tolerância para o esforço, ou seja, com baixos níveis de defesa, tendiam a ser mais bem sucedidas em PSI, enquanto que as pessoas, com baixa tolerância para o esforço, isto é, com altos níveis de defesa, tendiam a fracassar nessas experiências. Nas pesquisas com TFE (Teste das Figuras Encaixadas) ficou evidenciado que os chamados perceptivos globais apresentavam maior índice de acertos do que os classificados como perceptivos analíticos.

 

É possível que as pessoas apresentem propensão para, seletivamente, acertar determinadas coisas e errar outras. Realizando experiência com precognição, John A. Freeman constatou uma forte tendência à resposta diferen­cial entre os sexos, o que sugere, de logo, a necessidade de tratamento diverso, na pesquisa Psi, segundo se trate de homem ou de mulher. Outra implicação que se poderia inferir do experimento referido é que o médium se asseme­lharia a um andrógino psíquico, por sua facilidade em acertar, com frequência, um elevado número de coisas, sem demonstrar marcante preferência por esta ou aquela. É imprescindível, por conseguinte, pesquisar-se, cada vez mais, com um número sempre crescente de pessoas, não apenas para se obter dados estatísticos de alta significação, mas, prin­cipalmente, para descobrir o que há de comum, paranormalmente, em todos os indivíduos.

 

Parece que possuímos certos hábitos psíquicos bem estruturados e que podemos denominar de trilhas psí­quicas, espécie de circuitos mentais integrados, mediante os quais repetimos os mesmos assuntos, utilizando os mes­mos argumentos, gestos ou palavras. Basta que, numa con­versação, seja acionado um desses circuitos, para reproduzirmos tudo aquilo que está gravado neles.

 

Assim, quando convivemos muitos anos com uma pessoa, acostumamo-nos a juntar as nossas trilhas psíqui­cas e, em consequência, estabelecemos novas trilhas psí­quicas comuns. Por outro lado, essas trilhas psíquicas comuns são, geralmente, acionadas pelos mesmos estímulos que possibilitaram sua formação. Deste modo, quando duas pessoas de trilhas psíquicas comuns recebem aqueles estí­mulos ou outros semelhantes são, naturalmente, levadas a pensar na mesma coisa, via de regra simultaneamente, dan­do-lhes a falsa impressão de que passaram por uma experi­ência telepática.

 

Aliás, já se observou a influência de hábitos mentais na própria experimentação parapsicológica, con­sistindo na repetição das mesmas sequências de cartas nos testes com baralho Zener Pensa, por isso, J.B. Rhine (12) que “há possibilidade de duas pessoas – agente e percipiente – apresentarem idênticos hábitos quanto à ordem dos símbolos”. Também anotou Rhine (13) que, aparentemente, “algumas pessoas podem atuar melhor com a percepção extra-sensorial sob condição em que a atenção está dividida”.

 

No Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas – I.P.P.P., estamos adotando uma estraté­gia na pesquisa, cujos resultados iniciais têm sido promis­sores. A experiência não é feita quando o pesquisador quer, mas quando o candidato a solicita por sentir a im­pressão de que, naquela oportunidade, poderá apresentar um bom desempenho. É uma atitude diametralmente oposta a de certos pesquisadores que, de uma forma ou de outra, coagem o médium a demonstrar as suas faculdades, mesmo em condi­ções contrárias ao seu estilo, resultando, como consequên­cia, no fracasso da experiência. O médium não está e nem deve sentir-se obrigado a provar a sua paranormalidade a todo o momento e em qualquer circunstância. Ao pesquisador compete facilitar o desempenho do médium e não criar obstáculos à manifestação de sua faculdade. Ele deve orien­tá-lo a respeito do objetivo da pesquisa, exortá-lo a ser também um pesquisador de sua paranormalidade, criando, assim, um clima altamente amistoso e favorável à coopera­ção reciproca. Até o momento, em geral, o papel do pesquisador é, psicologicamente, o de opressor, pela ma­neira formalmente cautelosa de lidar com o médium, como se se tratasse de uma sindicância policial.

 

Atualmente, no I.P.P.P., estamos realizando no­vos experimentos telepáticos, cujos resultados ainda não são, ate o momento, estatisticamente conclusivos.

Faremos, aqui, menção daqueles que nos parecem mais significativos.

 

 

 

 

 

EFEITO DE AMPLIFICAÇÃO DO SINAL TELEPÁTICO POR REFORÇO G8UPAL

 

1

 

Para sua fundamentação, apoiamo-nos na premissa de que a telepatia não se rege apenas pela lei da afinidade, pois, se assim o fosse, ela só ocorreria entre pessoas conhecidas e que estivessem fortemente ligadas por vínculos afetivos. Sabe-se, porém, que, em inúmeros casos, notadamente através de comunicações mediúnicas, ocorreu intercâmbio telepático entre pessoas desconhecida Como, pois, explicar tão insólito fenômeno?

 

Parece-nos que o fator afinidade não é a conditio sine qua non da telepatia. A afinidade deve ser fator de reforço, da mesma forma que a emoção, e que amplifica o sinal psigâmico, facilitando o intercurso telepático. Assim, ao que tudo indica, o que realmente estabelece o vínculo telepático entre as pessoas é a semelhança de seus padrões psíquicos. Aceita essa premissa, podemos argumentar que, embora certas pessoas estejam profundamente ligadas por fortes vínculos afetivos, dificilmente se relacionarão telepaticamente, se os seus padrões psíquicos forem dissemelhantes. Entretanto, é de salientar-se que a afetividade entre as pessoas pode ser consequência da semelhança de seus padrões psíquicos.

 

A nossa hipótese, portanto, é que a afinidade ou afetividade se constitui em amplificador do sinal telepático e, não, em condição essencial desse evento psigâmico.

 

Admitindo-se que duas pessoas apresentem padrões psíquicos semelhantes, podemos destacar, num experimento as seguintes variantes:

 

1) O emissor e o receptor são telepaticamente medíocres;

2) O emissor é bom, mas o receptor é medíocre;

3) O emissor é medíocre e o receptor é bom;

4) O emissor é bom e o receptor também.

 

O fenômeno telepático, na última hipótese, se realiza satisfatoriamente, pois o sinal psigâmico é forte e o receptor é bastante sensível para captá-lo com facilidade.

 

Contudo, mesmo nas condições favoráveis referidas, é importante que ambos os telepatas estejam em boa forma, fí­sica e psicologicamente. Se um deles, no momento da expe­riência, estiver indisposto, perturbado emocionalmente, adoentado, com cansaço físico ou mental, o fenômeno, por certo, diminuirá muito de intensidade, podendo até não ocorrer. Por isso, sempre é recomendável registrar as condições de saúde dos telepatas, antes do início das ex­periências, anotando suas impressões durante e após as mesmas.

 

Acreditamos, a priori, que o maior prejuízo ex­perimental deva ocorrer na hipótese da indisposição do re­ceptor, pois, uma vez diminuída sua sensibilidade paranormal, ele não consegue recepcionar, adequadamente, o sinal psigâmico emitido, por mais intenso que seja. Já o mesmo, teoricamente, não deve ocorrer na indisposição do emissor, pois o sinal fraco que, nessas condições, transmite, pode ser amplificado pela alta sensibilidade psigâmica do re­ceptor.

 

Ora, se o êxito da telepatia depende, principal­mente, de um bom receptor. Uma vez encontrado este – o que, na prática, não é fácil -, o problema deveria estar inteiramente solucionado. Porém, ainda não está. O re­ceptor, na nossa hipótese, é fator necessário, mas não su­ficiente, para o sucesso telepático. Importa, como já vi­mos, que também se disponha de um bom emissor, capaz de enviar um sinal psigâmico suficientemente forte para ser facilmente captado pelo receptor. E, quanto mais forte for esse sinal, naturalmente com maior facilidade será apreendido pelo receptor e, teoricamente, de modo instan­tâneo, evitando o fenômeno da latência telepática, ou se­ja, o retardamento da conscientização da mensagem paranormal. Parece-nos evidente que esse retardamento nem sempre é ocasionado pela debilidade do sinal que, precariamente captado, necessita de algum tempo para ser conscientiza­do. O retardamento, também conhecido como efeito de des­locamento, pode, em alguns casos, originar-se de um “blo­queio” ocasional do receptor, “bloqueio” esse decorrente de causas mais diversas. Entretanto, é francamente ad­missível que um sinal muito forte possa, em curto prazo, vencer esse “bloqueio” e aparecer à consciência do recep­tor.

 

Sabemos que a emoção é um extraordinário ampli­ficador do sinal telepático. E, quanto mais forte a emo­ção, mais intenso e dramático é esse sinal. Por isso é que os estados psíquicos decorrentes de traumas físicos ou psico­lógicos são aqueles que mais facilmente são transmitidos e captados. Daí, a razão da palavra telepatia, isto é, so­frimento à distância.

 

Ora, uma emoção de alta intensidade, como é ób­vio, não pode ser experimentalmente obtida em laboratório. Por mais que o emissor se esforce, por mais boa vontade que ele tenha, não pode, consciente e voluntariamente, re­produzir ou simular uma emoção de tal porte.

 

O que se fazer, então, para se obter, até certo ponto, um sucedâneo para a emoção?

 

Propusemos, no I.P.P.P., um experimento simples que pudesse testar a possibilidade, em abordagem estatís­tica, do reforço do sinal telepático. Esse reforço seria obtido pela colaboração de outras pessoas, junto ao tele­pata emissor, na transmissão de cada uma das cartas Zener. Assim, duas ou mais pessoas emitiriam um mesmo sinal para o receptor e, ao final de uma série de experiências, con­frontaríamos a média obtida pelo receptor no teste Zener comum com a média obtida por ele no experimento com refor­ço grupai. Se esta última fosse superior àquela, seria evidente a realidade do reforço e, por conseguinte, a possibilidade de amplificação do sinal psigâmico.

 

As primeiras experiências realizadas foram de pouca significação, isso porque não contando, no momento, com médiuns disponíveis, as tentativas se limitaram ao âmbito dos membros do I.P.P.P.

 

Ademais, para que esse experimento, teoricamen­te, possa atingir seu objetivo, é necessária a seleção prévia dos participantes, através de testes preliminares, para a escolha daqueles que, aparentemente, apresentem padrões psíquicos semelhantes.

 

 

PSI-GESTALT

 

2

 

Neste experimento, o telepata emissor, após dis­tribuir as 25 cartas do baralho Zener num quadro de 5 co­lunas, contendo cada qual 5 cartas, ou mesmo numa só co­luna, vertical ou horizontal, procura transmiti-las, si­multaneamente, ao telepata receptor.

 

Os testes realizados no I.P.P.P. – em telepatia e clarividência – revelaram que os seus resultados, quanto ao índice estatístico em nada diferem daqueles esperados pelo método Zener tradicional.

 

A diferença básica entre a Psi-Gestalt e o méto­do referido é que, neste, as cartas são lançadas sucessi­vamente e, naquele experimento, as cartas são enviadas simultaneamente pelo médium emissor ao médium receptor, o qual, numa apreensão global ou gestáltica, deverá adi­vinhar a exata posição de cada carta nas colunas respec­tivas ou na única coluna vertical ou horizontal.

 

Nos testes de Psi-Gestalt não há que se falar em carta-alvo, eliminando-se, por conseguinte, a possibili­dade do efeito de deslocamento.

 

Outra vantagem da Psi-Gestalt é a sua rapidez. Muitos testes podem ser feitos num menor espaço de tempo, sem fatigar demais o médium, o que, de logo, concorre para a diminuição da incidência do efeito de declínio.

 

As nossas primeiras experiências com esse novo modelo têm demonstrado que a Psi-Gestalt é mais atrativa e lúdica do que o teste Zener tradicional, mantendo, as­sim, por tempo maior, a motivação dos médiuns pela conti­nuação da pesquisa.

 

 

SELEÇÃO TELEPÁTICA GRUPAL

 

3

 

Este experimento consiste na participação con­junta de várias pessoas que, isoladamente, desenham signos Zener, formando 5 colunas com 5 cartas cada uma, apenas uma coluna vertical ou horizontal. Em seguida, testes são recolhidos a fim de se averiguar as coincide cias na distribuição dos signos nas colunas entre os participantes. A repetição dos testes poderá determinar quais as pessoas que entre si apresentam maior número de coincidências. Trata-se, como se vê, de um teste preliminar para selecionar pessoas com padrões psíquicos semelhantes, visando um experimento futuro em condições me adequadas.

 

No I.P.P.P., estamos utilizando esse nosso método com a necessária cautela e os seus resultados, até agora são bastante animadores.

 

Disse, certa vez, J.B. Rhine (14) que “a Parapsicologia é ciência para o futuro”. Acreditamos, no entanto, que ela já é uma ciência do presente e que o seu futuro consiste em proporcionar uma visão cada vez mais ampla e unificada da controvertida natureza humana.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

( 1) RHINE, J.B. O alcance do espírito. Bestseller – Importadora de Li­vro S/A, 1965. pág. 217.

( 2)             . O novo mundo do espírito. Importadora de Livro S/A. 1966. pág. 31.

( 3) CARRINGTON, Wately. La telepatia. Editorial Dedalo, Buenos Aires, 1975. pág. 202.

(4) NOTZING, A.F. von Schrenck. Problemas básicos de la parapsicologia Ediciones Troquel, Buenos Aires, 1972. pág. 141.

( 5) BOZZANO, Ernesto. Comunicação mediúnica entre vivos. Edicel, 1968. pág. 99.

( 6) RHINE, J.B. 0 alcance do espírito. Bestseller – Importadora de Li­vro S/A, 1965. pág. 208.

(7) RHINE, J.B. & FRATT, J.G. Parapsicologia. Fronteira científica da mente. Hemus, 1966. pág. 13.

( 8) SUDRE, René. Tratado de parapsicologia. Zahar, 1966. pág. 97.

( 9) SHEKMANN, Harold. Como aproveitar a percepção extra-sensorial. Re- cord, 1966. pág. 46.

(10)           THOULESS, Robert. Parapsicologia. Editorial Paidós. Buenos Aires,1973. pág.     40.

(11)           RIZL, Milan. Parapsicologia atual: fatos e realidade. Ibrasa, 1976. pág. 96.

(12)           RHINE, J.B. Novas fronteiras da mente. Ibrasa, 1965. pág. 119.

(13)           Novas  fronteiras da mente. Ibrasa, 1965. pág. 127

(14)           0 novo mundo do espírito. Bestseller – Importadora de Livro S/A, 1966. pág 249.

 

(*) Tese apresentada no II Congresso Nacional de Parapsicologia e Psicotrônica, realizado no Sheraton Hotel, Rio de Janeiro, de 20 a 22 de outubro de 1979.

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