Valter da Rosa Borges
Os fenômenos paranormais não podem mais ser refutados ou ignorados, apesar do incômodo que causam aos espíritos dogmáticos e preconceituosos. Inútil, a esta altura, a tentativa de confundi-los com crendices populares, superstições, artes mágicas, feitiços ou milagres.
Já dissemos, em artigo anterior, que nem tudo o que é aparentemente insólito e inexplicável é fenômeno paranormal. As pessoas, via de regra, é que se deixam seduzir, num misto de fascínio e de terror, pelo maravilhoso e, inconscientemente, talvez por um resquício lúdico da infância, preferem a fantasia à realidade, assentindo, assim, em serem enganadas. Atraídas pelo fantástico, pelo sobrenatural, tornam-se ingénuas e facilmente sugestionáveis, predispondo-se a “experiências transcendentais” e comunicações cabalísticas com seres de outras dimensões e discos voadores. O privilégio de tais “contatos” acicata-lhes a vaidade, pois se julgam pessoas “escolhidas” para “missões salvacionistas”, disto se valendo os espertalhões que, fingindo-se de mestres ou “gurus”, dotados de conhecimento esotérico e poderes excepcionais, delas se aproveitam para benefícios pessoais.
O homem é amante incorrigível do mistério e se apaixona, perdidamente, por tudo o que não pode compreender ou dominar. Daí, o inusitado interesse que os fenômenos paranormais despertam em espíritos infantis, carentes de proteção e ânimo crítico, levando-os a se tornarem adeptos fervorosos e militantes fanáticos de grupos religiosos, que pretendam manter ligações permanentes com espíritos desencarnados e seres de outros planetas.
É mister, por isso, conscientizar as pessoas de que a Parapsicologia nada tem a ver com essas excentricidades e de que os delírios do inconsciente de certos médiuns psicógrafos não constituem fenômenos paranormais. E há tanta gente preocupada com os espíritos fabricados por sua imaginação que chega ao cúmulo de esquecer-se do seu próprio! Nesse clima de exacerbado misticismo, a pesquisa cientifica dos fenômenos paranormais é tarefa de difícil, ou mesmo quase impossível, realização.
Quando, há cinco anos atrás, fundamos o Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas, estávamos cientes e conscientes dessa dificuldade. E, por isto, estabelecemos um projeto de pesquisas, com vistas as nossas limitações e a real dimensão do problema. Em raras ocasiões, pudemos executar o nosso projeto e, assim mesmo, sem possiblidade de concluir a pesquisa face à deserção dos médiuns investigados.
Em nossa metodologia de trabalho, dicotomizamos a investigação dos eventos paranormais em duas modalidades: a) casos espontâneos; b) experimentação controlada.
No tratamento dos casos espontâneos, utilizamo-nos do inquérito, que consiste na coleta de testemunhos das pessoas que presenciaram o fenômeno estudado. E ouvida, também, sempre que possível, a pessoa suspeita de ser o “agente paranormal”, isto é, o médium e registramos todas as circunstâncias em que o fenômeno relatado ocorreu, Tal procedimento não visa, precipuamente, provar a autenticidade do fenômeno, mas colher subsídios que, ao menos, sugiram a sua paranormalidade.
Infelizmente, quase todos os casos investigados pelo nosso Instituto não resistiram a uma análise mais acurada e foram rejeitados como suspeitos ou falsos. Um deles foi o famoso caso do “fantasma da Faculdade de Direito”, cuja “aparição” numa sala de aula e na presença do professor Rosa e Silva e seus alunos, suscitou uma série de reportagens, através das páginas do JORNAL DO COMMERCIO. O mistério foi logo desvendado por pesquisadores do nosso Instituto e o fantasma” identificado. Tratava-se de pessoa viva e de hábitos excêntricos, conforme se vê na edição de 17 de janeiro de 1975 daquele conceituado órgão da imprensa.
As nossas experimentações controladas também não tiveram melhor sorte. Nesse tipo de pesquisa, o médium é, previamente, entrevistado e, em certas situações, conforme o tipo de fenômeno que diz produzir, encaminhado a um psicólogo, com o objetivo de se obter um conhecimento mais profundo de sua personalidade. Em seguida, inicia-se a série de sessões experimentais com o médium sob controle dos pesquisadores, porém já, advertido da necessidade indeclinável dessa providência. Dos poucos médiuns que conseguimos pesquisar, nessas condições, nenhum perseverou até o fim da investigação, alegando os mais diversos motivos para justificar a desistência. Um deles, uma senhora que se dizia médium espírita, com mais de 30 anos de oficio, abandonou, de repente, as experiências, porque sentia que estava perdendo a sua mediunidade.
Há tempos atrás, um certo médium de materialização, então residente no Recife, foi por nós convidado a demonstrar, em sessão controlada, as suas decantadas faculdades. Porém, o seu “guia espiritual” se opôs, peremptoriamente, à realização da experiência e nos recomendou a leitura do Evangelho.
Frequentemente, através de vários amigos espíritas, temos tomado conhecimento das maravilhas que acontecem em “sessões mediúnicas”, realizadas em caráter doméstico ou em centros espíritas. Todavia, quando demonstramos interesses em participar dessas reuniões, eles se mostram reticentes ou tergiversam, alegando que, para isso, necessitam da autorização do “guia-espiritual” que dirige os trabalhos. Acontece que, até agora, nenhum “guia-espiritual” deferiu nossa pretensão, o que nos deixa a impressão incômoda de que não temos o mínimo prestígio com as pessoas do Além. Com isto, não queremos dizer que tais fenômenos relatados por pessoas que nos merecem confiança, não sejam autênticos, mas que, da maneira como vêm possivelmente ocorrendo, estão destituídos de validade científica e apenas servem como matéria de doutrinação religiosa.
A maioria dos parapsicólogos procura obter um relativo controle sobre o fenômeno paranormal, adotando, em suas pesquisas, o método quantitativo – estatístico – matemático, preconizado por J. B. Rhine, utilizando, para isso, o baralho Zener. O método, contudo, pelas suas limitações, não proporciona resultados brilhantes, pois a interminável repetição das experiências afeta desfavoravelmente o desempenho das pessoas pesquisadas, à medida que elas se prolongam.
Com o emprego do método qualitativo, os resultados se apresentam encorajadores, pois não se visa o controle do fenômeno, mas do médium, com o propósito de se minimizar a possibilidade da fraude. O fenômeno produzido, em tais circunstâncias experimentais, vale por si mesmo. Os pesquisadores se limitam a esperar que o fenômeno aconteça, em boas condições de observação, mantendo o médium sob severa vigilância. Este, por sua vez, conscientizado de que não pode obter o fenômeno esperado a seu talante, procura, numa atitude de total receptividade, favorecer sua manifestação. Pouco importa o número de sessões consumidas nesta empresa, pois um só resultado positivo compensa toda uma série, por mais longa que seja, de tentativas fracassadas.
A pesquisa paranormal tem suas regras que, observadas, concorrerão para o êxito das experiências, visto que médiuns e pesquisadores são solidariamente responsáveis na consecução desse intento.
A mais importante dessas regras é não exigir do médium a realização de um fenômeno que ele não está apto a produzir ou forçá-lo a realizar os que lhe são habituais, sob quaisquer circunstâncias.
A outra regra de que não se deve descurar é aquela que recomenda a adoção de medidas que promovam o bom relacionamento pessoal entre pesquisadores e médiuns, o que não dispensa a permanente fiscalização e controle das experiências.
Finalmente, é de todo recomendável que se estimula a autoconfiança do médium, visando a melhorar o seu desempenho, conscientizando-o, previamente, de que ele não é diretamente responsável pelo êxito ou fracasso das manifestações de sua faculdade.
É assim que procedemos no Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas, quando somos procurados por pessoas que, na suposição de que são médiuns, desejam, sinceramente, submeter-se a uma pesquisa para a investigação de sua pretensa paranormalidade.
(*) Publicado no Jornal do Commercio, de 21 de maio de 1978.