Valter da Rosa Borges
O ponto crucial, para a correta aplicação do direito, é a prova. Tudo o que se pleiteia, em Juízo, tem de ser provado. Nada se pode decidir sem prova. Como nada é absoluto, a prova em Direito também não o é. O que se espera é que ela seja verossímil e, portanto, capaz de formar a convicção do julgador.
O Direito é um processo dinâmico que busca disciplinar o modus vivendi da sociedade, acompanhar os progressos da ciência e da tecnologia, e avaliar situações novas suscetíveis de gerar relações jurídicas.
Estabelece o Código de Processo Civil, no Artigo 332:
Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.
Apesar disto, alguns juristas alegam que, se o fim precípuo do processo é a descoberta da verdade, é admissível a prova ilegalmente obtida, desde que demonstre ao juiz a sua veracidade, embora reconheçam que aquele que cometeu o ato ilícito deverá responder criminalmente por ele.
Outros juristas, de modo contrário, sustentam que é preferível que um crime fique impune do que se se outorgar eficácia à um prova contra legem que o deslindou.
Dispõe o Artigo 157, do Código de Processo Penal:
O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova.
Ressalte-se que o elenco das provas admissíveis em Direito é apenas exemplificativo, pois, se não o fosse, seria um obstáculo para o exercício da ampla defesa. Podem, assim, as mensagens psicografadas ser admissíveis como prova em Direito?
Ora, a mensagem psicográfica, embora não prevista em lei, é admissível como prova, também porque não é contra legem. Ademais, já existem decisões judiciais, que a admitiram.
Como no processo penal, não há hierarquia de provas, e o juiz formará a sua convicção pela livre apreciação de cada uma delas, as mensagens psicografadas podem ser admissíveis como prova documental, desde que se harmonize com o conjunto das provas produzidas.
Aqui, não se está discutindo se a mensagem psicografada se originou de uma pessoa falecida, pois não cabe ao Juiz pronunciar-se sobre questões transcendentais: a sobrevivência post-mortem não é uma questão jurídica. Portanto, sob esse aspecto, não se deve atribuir a autoria da mensagem psicografada a um Espírito, mas ao psiquismo inconsciente do psicógrafo. O cerne do problema é o reconhecimento jurídico de que a mente humana possui aptidões extraordinárias, capazes de tomar conhecimentos de fatos por meios não convencionais.
A percepção extrassensorial é um fato exaustivamente comprovado pela pesquisa científica no campo da Parapsicologia. Por que, então, o jurista se permitiria alhear-se a constatações de suma importância para o entendimento mais aprofundado do ser humano?
Isto posto, não interessa ao Juiz investigar como um “médium” consegue acesso a informações dessa natureza, mas sim a veracidade das informações para que elas possam ser consideradas elemento probatório.
Médiuns que, em Parapsicologia, são denominados agentes psi, têm prestado serviços à investigação criminal. Um dos mais famosos foi o falecido Gerard Croiset. Ele colaborou, com a polícia de vários países da Europa, na descoberta do paradeiro de pessoas desaparecidas.
O Canal Discovery vem apresentando casos verídicos de colaboração de paranormais com a polícia na elucidação de crimes de difícil elucidação.
Poder-se-ia contra-argumentar, alegando que a admissão desse tipo de prova, abriria um perigoso precedente para o abuso de cartas psicografadas em procedimentos judiciais. É uma probabilidade viável, mas que seria analisada em cada caso concreto. Ademais, por que se invalidaria essa prova, sob a alegação de seu possível abuso?
A prova é sempre uma questão delicada nas atividades policiais e judiciárias. Elas variam no que diz respeito ao grau de sua confiabilidade. A prova testemunha é a mais frágil de todas, pois a percepção do ser humano é afetado por fatores culturais e emocionais, entre outros. Os laudos periciais não estão isentos de falhas e os então famosos detectores de mentira podem ser burlados, nos seus resultados, por certos tipos psicológicos. Restam, então, as provas produzidas pelas impressões digitais e pelos testes de DNA. Até agora, eles não apresentaram falhas. Mas, quem pode garantir que, em todas as circunstâncias, eles sejam infalíveis.
Juristas e legisladores não podem dar-se ao luxo de desconhecer os avanços das ciências da mente, sob pena de esclerosar o Direito, tornando-o um instrumento obsoleto para atender, com a necessária precisão, as demandas sociais.
Se o psiquismo humano, como vem comprovando exaustivamente as pesquisas parapsicológicas, possui recursos cognitivos extraordinários, por que, então, excluir as informações fornecidas, por esse meio, na formação da prova judicial?
Nenhuma prova em Direito pode ser considerada inatacável. Testemunhas podem deliberadamente mentir ou perceber um fato segundo seu interesse consciente ou inconsciente no caso, ou ainda ser afetada por seu estado emocional no momento da prática de um crime. As provas documentais podem ser forjadas, fotos são suscetíveis de manipulação, equipamentos eletrônicas não estão isentos de falhas, perícias nem sempre são confiáveis, os detectores de mentira não funcionam em pessoas de temperamento frio ou que sabem controlar suas emoções. É o conjunto de provas coerentes entre si que influem no julgamento, e nem mesmo a unanimidade é garantia de uma decisão correta. Se assim o fosse, não existiriam erros judiciários.
Em Parapsicologia, uma mensagem psicográfica não é atribuída a um Espírito, mas, sim, ao inconsciente do psicógrafo. Logo, não se trata do depoimento de um Espírito, o que não teria qualquer valor comprobatório perante o Direito. Embora o médium espírita esteja crente de que se trata de uma mensagem do Além, a sua crença não importa na questão. O que importa é que a mensagem psicografada reforce as provas já produzidas ou traga indícios que possam ensejar uma nova interpretação do caso.
Uma só testemunha é prova suficiente para condenar uma pessoa que nega ter cometido um crime? Como ter certeza que a testemunha diz a verdade ou está equivocada? E, quando as testemunhas divergem entre si? Em qualquer dessas situações, deve prevalecer o princípio do in dubio pro reo. Logo, a prova testemunhal nem sempre é confiável, e, assim, necessita de outro elenco de provas para validá-la.
A própria confissão do réu não é prova inatacável, pois ele pode estar sendo pressionado por meios físicos e/ou psicológicos para assumir a culpa. Ou simplesmente o réu se auto-acusa para proteger alguma pessoa.
Em passado não tão remoto, foram utilizados os mais terríveis modos de tortura para obrigar uma pessoa a confessar um ato que não cometeu, caracterizado como crime contra o Estado e heresia contra a Igreja. Hoje, a tortura se restringe aos porões da polícia e às prisões militares.
Do mesmo modo, não se pode inocentar ou condenar uma pessoa com fundamento apenas em mensagem mediúnica. A informação, nela contida, pode não ser verdadeira. E mesmo que o seja, ela não se sustenta sem a confirmação de outras provas.
A mensagem psicográfica, segundo a Parapsicologia, é de autoria do “médium” e não do Espírito e, sob esse enfoque, não se trata de um fenômeno mediúnico, mas parapsicológico. Pouco importa que os espíritas não aceitem esse fato e acreditem que se trate da manifestação de alguém já falecido. A questão, portanto, não é religiosa, mas científica e, portanto, trata-se de um documento que, por não ser ilícito, é admissível como prova em Direito.