Valter da Rosa Borges
A Parapsicologia classificou os fenômenos paranormais em duas categorias: fenómenos de psi-gama, também denominados de ESP, ou percepção extrasensorial por J.B. Rhine e fenômenos de psi-kapa.
Os fenômenos de psigama são de natureza psíquica e se apresentam sob três modalidades: a) telepatia; b) clarividência; c) precognição.
A telepatia é conhecimento paranormal de fato psíquico, “como se” a mente de uma pessoa pudesse, em dado momento, receber ou captar informações da mente de outra pessoa ou, pelo mesmo processo, transmitir-lhe informações. De logo, se observa que os fatos psíquicos, comunicados telepaticamente, são, previamente, desconhecidos da pessoa que os recebe ou os capta.
A telepatia pressupõe o concurso mínimo de duas pessoas: a do telepata emissor e a do telepata receptor.
O telepata emissor é aquele que transmite, conscientemente ou não, voluntária ou involuntaramente, o comunicado paranormal.
O telepata receptor é o que recebe ou capta esse comunicado.
Discute-se, por isso, se o telepata receptor apenas recebe a informação transmitida pelo telepata emissor ou se, pelo contrário, é ele que, tomando a iniciativa, capta a informação diretamente do inconsciente deste. Na verdade é praticamente impossível saber quem iniciou processo telepático, pois o emissor só é assim considerado pela circunstância de ser o detentor da informação. E todo o erro consiste na nossa tentativa de procurar equacionar o problema da telepatia em termos de nossa experiência sensorial, aprisionando o fenômeno em nossos parâmetros de causa, tempo e espaço.
Ora, no momento em que afirmamos que alguém transmitiu e outrem recebeu um comunicado telepático, estamos situando, arbitrariamente, este fenômeno na nossa concepção de espaço.
Se cogitamos a respeito de quando se iniciou o evento telepático, estamos situando, arbitrariamente, este fenômeno psigâmico na nossa concepção de espaço.
Se cogitamos a respeito de quando se iniciou o evento telepático, estamos, também submetendo este fenômeno aos nossos padrões de tempo.
E, finalmente, se procuramos determinar quem iniciou o processo paranormal, atribuímos à telepatia a categoria de causalidade.
Assim procedendo, encerramos, definitivamente, a telepatia nos nossos conceitos de espaço, tempo e causa.
Mas, será que os fenômenos de psigama são redutíveis ao nosso modelo tridimensional? Os fatos observados não autorizam essa presunção. Tudo parece indicar que a mente humana funciona em outros níveis da realidade e que são inapreensíveis pelo nosso equipamento sensorial.
Há uma forte tendência entre os parapsicólogos — a qual, particularmente, me inclino — de se considerar a telepatia, a clarividência e a precognição como aspectos de um mesmo fenômeno, sendo a sua distinção, por conseguinte, meramente funcional e didática. Este modelo monista elimina, preliminarmente, os inconvenientes e as dificuldades decorrentes, na prática, em caso concreto, da definição de um dado fenômeno como telepatia ou clarividência.
A telepatia, como já o dissemos, é conhecimento paranormal de fato psíquico, o qual pode ou não se referir a um acontecimento do mundo material. Uma pessoa, por exemplo, pode, telepaticamente, empatizar o estado psíquico de outra que se encontra distante, partilhando de seus sentimentos e até de seus males orgânicos. Ou pode, por outro lado, tomar conhecimento de fatos que ocorreram ou que estão, nesse momento, ocorrendo com ela. Por isso, costuma-se pensar que a telepatia se refere a a eventos psíquicos presentes ou a acontecimentos passados que, por se encontrarem no inconsciente de uma pessoa, são suscetíveis de apreensão paranormal. É nesse ponto que se estabelece o impasse entre a telepatia e a precognição. Vejamos porquê.
A precognição, assim como a telepatia, se refere a fatos psíquicos, apenas com uma distinção: é que a telepatia diz respeito a eventos experimentados por uma pessoa e a precognição a acontecimentos que ainda, possivelmente, serão experimentados por ela. Então, como podemos ter a certeza de que os fatos futuros também já não estejam presentes no inconsciente das pessoas e, por isso, possam ser apreendidos telepaticamente?! De certo modo, o presente contém, potencialmente, o futuro, como o presente nada mais é do que a atualização de latências pretéritas. Se o homem, em certas circunstâncias, pode adivinhar o futuro, de onde ele captaria as imagens do devir, se estas, de alguma maneira, já não existissem em si ou alhures, em estado potencial?! A precognição, hoje, é um fato estabelecido, até experimentalmente, como o são os demais fenômenos de psi-gama. Logo, o futuro é, de certo modo, presente, como presente o passado é, podendo, a qualquer tempo, ser presentificado. A precognição, sob esse enfoque, é uma telepatia sobre o futuro, quando se refere ao conhecimento paranormal que se possa ter de outra mente. Ou um mero fenômeno criptomnésico — emersão de conteúdos psíquicos inconscientes ao consciente — desvelando o futuro da própria pessoa.
Se o homem pode adivinhar o futuro e, apesar disto, não dispõe de recursos para controlá-lo, então ele é o mais infeliz dos títeres, por estar consciente de sua situação de títere. Mas, se com o conhecimento do porvir, ele tiver a prerrogativa de intervir nesta programação, amoldando-a às suas necessidades, terá dado um passo gigantesco na sua condição de homem, ampliando a jurisdição do seu próprio existir.
Muita adivinhação do futuro, no entanto, não passa de apreensão de expectativas, temores, esperanças e outros anseios recônditos da alma humana. Assim, alguns médiuns, equivocadamente, interpretam esses conteúdos psiquicos como se fossem vislumbres de acontecimentos futuros. Se o futuro, ao que tudo indica, já está no presente sob formas psíquicas, criadas pelos nossos mais profundos desejos, a sua atualizacão em eventos concretos vai depender de certas circunstâncias favoráveis no momento oportuno .
(*) Publicado no Jornal do Commercio em 6 de junho de 1978