Estudos e pesquisas com bases científicas desenvolvidos no Brasil e no mundo tentam explicar (e entender) os fenômenos paranormais
Texto: Eliana Fonseca | Fotos: Arte: Paulo Werner, Joel Rocha, Marcos Rosa, Cristiano Marinz
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O que há de inexplicável em nossas vidas? A perda de um ente querido, vítima de uma tragédia. As indagações existenciais. Uma descoberta da ciência de difícil entendimento para os simples mortais – vide a criação do Grande Colisor de Hádrons (LHC), no trabalho para achar a partícula de Deus. Outros encontram o incompreensível em alguns relatos de gente que entorta e move objetos com a força do pensamento. Naqueles que se comunicam por telepatia. Ou naqueles que têm a capacidade de prever fatos antes de acontecerem. Há aqueles que chegam aos hospitais e encontram o impensável – médicos e paranormais debruçados em um mesmo projeto, o de tentar associar as percepções extra-sensoriais ao diagnóstico médico-hospitalar. O projeto em questão não faz parte de nenhum filme ou série norte-americana e, sim, está sendo desenvolvido no Brasil. Mais precisamente pelo Núcleo de Estudos dos Fenômenos Paranormais (NEFP) da Universidade de Brasília em parceria com o Hospital Universitário de Brasília (HUB) desde o início do ano. O projeto integra uma tendência de alguns cientistas e pesquisadores brasileiros: estudar, com seriedade e rigor científico, os chamados fenômenos extra-sensoriais.
Certo, o pensamento recorrente é associar esses tipos de fenômenos à charlatanice ou à religiosidade. Porém, não é novidade que os Estados Unidos e a Rússia iniciaram, há bem mais de três décadas, estudos sobre o assunto. Há pesquisas que indicam que pelo menos 20% da população mundial tenha lidado com algum desses fenômenos no decorrer de sua vida. No Brasil, pelo menos três instituições de ensino renomadas, a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e a Universidade de São Paulo (USP) têm pesquisadores e projetos com foco nos chamados fenômenos paranormais. Há também o Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas (IPPP) e a Faculdades Integradas Espírita, no Paraná, que se debruçam em estudar o tema. “Cabe às pesquisas distinguir entre os que podem ser considerados fenômenos paranormais, daqueles que possivelmente estão associados a psicopatologias”, explica o físico Álvaro Luiz Tronconi, coordenador do NEFP.
Atualmente, a USP já realizou um mapeamento das experiências paranormais em 306 pessoas, entre 18 a 66 anos. Nela, 82,7% alegaram ter vivenciado pelo menos uma experiência anômala extra-sensório-motora; há estudo de como as pessoas paranormais desenvolvem suas identidades psicossociais e como suas crenças paranormais são importantes para a constituição de suas personalidades; outra sobre a relação entre transe e a sociedade brasileira. Mas nem sempre a perspectiva científica é favorável à existência dos fenômenos paranormais. Em pesquisa realizada pelo próprio Zangari com 52 médiuns que alegavam poder para conhecer o futuro por meios paranormais, o resultado foi ou que esse poder não existia ou ele não podia ser capturado pelo método empregado pelo estudioso.
Fora das universidades, profissionais de áreas distintas também realizam pesquisas científicas para tentar investigar os fenômenos extrassensoriais. É o caso do delegado-chefe do Serviço e Registros Policiais para Investigação do Paraná, João Alberto Fiorini de Oliveira. Há cerca de dez anos, um dos meios utilizados por ele para solucionar um desaparecimento foi a parceria com um paranormal. O sensitivo localizou o corpo da pessoa, mas Oliveira lembra que foi o único trabalho na solução de crimes. “Na época era muito cético, não acreditava que essa parceria seria possível.” Tudo mudou há cerca de oito anos, quando o delegado viu notícia em um jornal sobre o caso de uma pessoa que teria a mesma impressão digital de outra que havia morrido. O espanto foi tão grande que resolveu iniciar uma pesquisa em que utilizou técnicas forenses como a datiloscopia – processo de identificação humana por meio de impressões digitais, o retrato falado, a grafoscopia – a escrita como marca pessoal, a genética, a medicina e a odontologia legal, biologia, química, física e psicologia. O resultado está no livro Reencarnação – Investigação Científica, lançado pela editora Sergraf. “Pesquisei mais de uma centena de pessoas. De fato, não houve qualquer comprovação de duas pessoas com as mesmas impressões digitais”, relata o delegado.
Para o presidente e fundador do Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas, Valter da Rosa Borges, essas e outras pesquisas científicas estão fazendo um caminho sem volta, em que a aproximação dos fenômenos paranormais da ciência está cada vez mais forte. O IPPP realizou, nas últimas décadas, dezenas de estudos de casos aparentes de manifestações paranormais espontâneas, a quase totalidade delas de fenômenos poltergeist. Nem todas, porém, como informa Borges, eram de natureza paranormal. “Atualmente, estudamos coisas do cérebro humano que pareciam de outro mundo há alguns anos. A ciência vai ter de engolir alguns sapos porque o paradigma científico não é um dogma. Logicamente, há pessoas que passaram a vida acreditando em algo e a mudança desse paradigma traz forte reação”, diz.
As instituições livres – não ligadas ao Ministério da Educação – também realizam pesquisas, caso das Faculdades Integradas Espíritas. Nela, há um laboratório de telepatia com os experimentos Ganzfeld, realizados há 13 anos. É a única no Brasil que utiliza a técnica alemã. A pesquisa – também financiada pela Fundação Bial – consiste em uma pessoa ficar em privação sensorial em uma sala e outra ficar em outro espaço, tentando ver e sentir o que está se passando na primeira. Os resultados, segundo o coordenador do curso de parapsicologia Reginaldo de Castro Hiraoka têm sido positivos.
Hiraoka busca na mitologia grega o mito do leito de Procusto para refletir sobre o embate entre ciência e fenômenos extra-sensoriais. Procusto vivia numa floresta e tinha uma imensa cama. Todos que passavam por esse local eram presos e colocados por Procusto em sua cama. Os que eram maiores que o leito tinham seus pés cortados. Os menores eram esticados. “Esse leito é justamente o paradigma da ciência, da sociedade, os nossos modelos. Cortamos os pés ou os esticamos para caberem nas nossas crenças. Esses fenômenos incomodam e estão além do nosso conceito de tempo, espaço, matéria. Incomodam porque mexem em todos os princípios norteados pelo que acreditamos. Tudo pode ruir. Quem quer perder a segurança?”
Viver Brasil
Segunda, 30 de Junho de 2014
CAPA