Jones Melo
O parapsicólogo Valter da Rosa Borges, presidente do Instituto Pernambucano de Pesquisas Psicobiofísicas e autor do livro “Introdução ao Paranormal”, conceitua a mediunidade, do ponto de vista do Espiritismo e da Parapsicologia, e explica que os médiuns não devem ser coagidos, embora devam ser rígidas as medidas de controle para se evitar a mínima possibilidade de fraude”.
Nesta entrevista exclusiva, Valter Rosa Borges afirma “ser sempre recomendável que o médium fique sob a orientação e o controle de pesquisadores experimentados, a salvo de leigos e de místicos, que, pelo despreparo científico – e também por fanatismo religioso – poderão ocasionar-lhe sérios prejuízos físicos e psicológicos”.
- – O Espiritismo e a Parapsicologia empregam a mesma palavra: médium. Para ambos, ela tem o mesmo significado?
- – Não. Para o Espiritismo, o médium é um intermediário entre os vivos e os mortos. É uma espécie de ponte, de corredor entre dois universos fenomenicamente diferentes. O médium, assim, é a condição indispensável para a manifestação paranormal, cuja causa é atribuída aos espíritos desencarnados.
A Parapsicologia, até prova em contrário, em cada caso concreto, explica o fenômeno paranormal pela ação do inconsciente do próprio médium. Assim, o médium não é condição, mas causa desse fenômeno. Na verdade, sob o ponto de vista estritamente psicológico, o médium é uma pessoa extremamente predisposta a estabelecer um relacionamento mais amiúde e ostensivo entre os dois universos ontológicos da consciência e da inconsciência.
- – Qual a definição de médium?
‘ RB. – Poderíamos definir o médium como uma pessoa que, habitualmente, em sua presença, se produzem fenômenos paranormais. A habitualidade, portanto, é a marca característica da atividade paranormal numa determinada pessoa.
- – Todas as pessoas são médiuns?
- – A doutrina espírita diz que sim. Os fatos, no entanto, têm demonstrado o contrário. Mesmo que se afirme que, potencialmente, a mediunidade seja um patrimônio comum da humanidade, estaríamos, ainda assim, no terreno da especulação filosófica e, não, no da experimentação científica.
A experiência tem evidenciado que, de fato, poucas são as pessoas efetivamente dotadas de faculdades paranormais. No entanto, é incontável o número de pessoas que, ao menos uma vez na vida, passaram por uma experiência paranormal. Acontecimentos episódicos, todavia, não indicam a existência dessa faculdade em determinados indivíduos.
- – Como é possível se saber se uma pessoa é médium? Há algo que indique a existência da faculdade paranormal numa pessoa?
- – Não há qualquer indício físico ou psicológico para determinar a paranormalidade de uma pessoa. Só a experimentação poderá esclarecer a procedência da suspeita inicial decorrente de uma manifestação inusitada, em cada caso concreto.
DP – É possível desenvolver a mediunidade de uma pessoa?
- – Sob o ponto de vista estritamente parapsicológico deveremos substituir a palavra mediunidade pela expressão paranormalidade. A mediunidade, conforme a doutrina espírita, é a aptidão que uma pessoa possui de estabelecer contato com os espíritos desencarnados. Assim, para a Parapsicologia, ao menos até o momento, a mediunidade é uma hipótese. Ao contrário, a paranormalidade é um fato comprovado experimentalmente, demonstrando a capacidade de que certas pessoas são dotadas para produzir fenómenos insólitos, os quais, na quase totalidade dos casos, fogem inteiramente do seu controle.
Assim, se se entender por desenvolvimento da faculdade paranormal o gradativo controle da manifestação fenomênica e não o processo compulsório do seu hipotético crescimento, a minha resposta é naturalmente afirmativa. Na verdade, como bem observou J.B. Rhine, a faculdade paranormal não é suscetível de aprendizado, sob o ponto de vista de um procedimento estereotipado. Diria mais: cada médium, empiricamente, aprende uma maneira toda particular de produzir uma manifestação paranormal. Ele desenvolve uma técnica, descobre um “jeitinho” de liberar os seus poderes latentes, anulando, momentaneamente, os condicionamentos e a censura do seu consciente. Assim, com o passar do tempo, a sua faculdade vai, gradativamente, adquirindo autonomia de ação e reduzindo os fatores impeditivos de sua manifestação.
Hoje, na União Soviética, alguns médiuns, em certas circunstâncias, já conseguem, voluntariamente, realizar fenômenos Psi-Kapa. Por conseguinte, em futuro próximo, o médium poderá tornar-se o senhor de sua faculdade paranormal, utilizando-a em seu benefício e até mesmo da própria humanidade.
- – O médium, então, é uma pessoa especial?
- – Ele é uma pessoa tão especial como qualquer outra dotada de uma aptidão especial. É essa especialidade de aptidão que o distingue do comum dos indivíduos.
A paranormalidade, portanto, é também uma aptidão. Não é um dom, não é um carisma, não é um privilégio. É uma aptidão. E se toda aptidão é um privilégio, os médiuns não são as únicas pessoas privilegiadas.
- – Muitos médiuns, ao menos no passado, fraudaram. Essa circunstância não deve, em tese, tornar suspeitos todos os médiuns?
- – Em princípio, qualquer fenômeno inusitado não deve ser, de logo, classificado ou admitido como paranormal. Cada caso concreto deve ser pesquisado, minuciosamente, em todos os detalhes, a fim de se evitar, o quanto possível, a possibilidade de fraude. Aliás, conforme acentuei no meu livro “Introdução ao Paranormal”, o êxito de toda e qualquer pesquisa, no campo da paranormalidade, está na dependência da observância de certas e determinadas regras. Assim, não raro, o insucesso das experiências é devido mais à incompetência e à inabilidade de pesquisadores improvisados ou mal preparados do que mesmo às deficiências do próprio médium. Na verdade, uma das regras básicas da pesquisa é não se exigir do médium a produção de fenômenos incompatíveis com o tipo de sua paranormalidade. Por outro lado, é fundamental estimular a autoconfiança do médium nos seus poderes, mantendo elevada a sua motivação pelas pesquisas, as quais deverão ser realizadas em ambiente tranquilo e confortável e num clima de bom relacionamento entre todos os participantes das experiências.
Importante, também, é evitar-se toda e qualquer forma de coação sobre o médium, o que não importa o relaxamento de rígidas medidas de controle para se evitar a mínima possibilidade de fraude. Por isso, é sempre recomendável que o médium fique sob a orientação e o controle de pesquisadores experimentados, a salvo de leigos e de místicos, os quais, por seu despreparo científico – e também por fanatismo religioso – poderão ocasionar-lhe sérios prejuízos físicos e psicológicos.
É de suma importância, ainda, esclarecer o médium a respeito da natureza de sua faculdade paranormal, evitando ou combatendo as naturais manifestações do seu narcisismo, decorrente da falsa ideia de que ele é um ser privilegiado. A partir do momento em que o médium é afetado pela doença do “estrelismo”, torna-se refratário a qualquer tipo de investigação científica dos seus poderes, com o receio, consciente ou inconsciente, de comprometer o seu status mediúnico.
Diário de Pernambuco
Na edição de 17 de abril de 1983